terça-feira, 13 de setembro de 2016

É golpe?

Golpistas não gostam de serem chamados de golpistas, assim como racistas não gostam de serem chamados de racistas. Mas o fato de não gostar de assumir minhas atitudes não me exime de ser o que as ações demostram.
Os golpistas argumentam que não há nada de ilegal no impeachment da presidenta Dilma, assim não houve golpe. Pois golpe seria um ataque à legalidade, uma deposição forçada e uma imposição inconstitucional de um outro governo.
Primeiro, deste modo, os pró impeachment assumem que em 1964 houve um golpe, visto que Goulart foi deposto por uma ação orquestrada dos militares, quando o senador Auro Andrade numa ação inconstitucional declarou vaga a presidência da república e iniciou o processo do regime militar no Brasil.
Mas, segundo, o que é golpe? Refiro me ao sentido da palavra. Quem estabeleceu o sentido oficial? As palavras são, pela sociedade, carregadas de sentido, esvaziadas, ressignificadas. Assim sendo, golpe é aquilo que a população diz que é. Shakespeare diz que as coisas têm nomes aleatórios, Lewis Carol diz que as palavras têm exatamente o sentido que eu quero que tenham. Deste modo, se a população diz que é golpe, é golpe; e os dicionários e códigos jurídicos que se virem para se adaptar.
Bem, falando nisto, vamos pensar sobre o uso de termos. E eu escolhi dois termos, DEMOCRACIA e GOLPE.
Quero apresentar um pequeno resumo sobre como esses termos podem ser vistos na história.
Democracia - damos aos gregos o mérito dela, quando estudamos a história da Grécia afirmamos que foram eles quem desenvolveram a democracia. 
Em Atenas, Dracon, Solon e Clístenes implantaram o que conhecemos como democracia. Um sistema de governo que os líderes são eleitos pelos cidadãos e as decisões são tomadas por eles também, e a palavra final é de acordo com a vontade da maioria.
Mas em Atenas tinha um problema, somente os homens livres que soubessem ler eram parte da democracia. Aqui, se fossemos ser chatos, poderíamos dizer que não existia democracia em Atenas, pois DEMOS é a palavra grega para povo e como poderia ser democracia se o povo feminino e o povo iletrado ou escravo ficavam fora da democracia?
Mas vamos a diante, a sociedade cristã primitiva, essa também desenvolveu a ideia de democracia em suas decisões. Quando era para se escolher o bispo de uma paróquia, eram os membros da paróquia que decidiam, inclusive a escolha do Papa cabia à população da cidade de Roma. 
Mas isso muda durante a Idade Média e a cristandade coloca sobre os cardeais essas decisões, somente os protestantes voltam com essa ação democrática.
Como desenrolar do protestantismo, surge o iluminismo com a democracia.
A democracia que existe no século XXI já não é mais igual a democracia ateniense, nem mesmo idêntica à democracia iluminista, mas é uma democracia influenciada pela Declaração de independência dos EEUU, pela Revolução Francesa, por Gandhi, por Martin Luther King Jr. etc.
Assim, a democracia que vivemos hoje, não é a democracia grega, nem iluminista, mas e a democracia das constantes conquistas populares em adentar nas decisões políticas.
Por exemplo, aqui no Brasil, quando nos tornamos independentes, na Constituição de 1824 ficou estabelecido que ao povo caberia as eleições dos deputados. Mas para elege-los era necessário ter 100 mil contos de réis, e os ex-escravos só podiam votar, não podiam ser votados. Depois, na Constituição republicana de 1891, a democracia só atingia aos letrados. - Veja que democracia não pode ser um termo visto como absoluto, mas dentro de uma realidade temporal e local.
Para falar de Golpe, vamos nos referir a momentos na história que uma instituição governamental foi trocada, pela força das armas, ou por manipulação das leis.
Viajemos ao Antigo Egito, na 18a dinastia, e conheçamos Hatshepsut, grande faraona que com poder de manipulação governou no Egito deixando seus esposos, legítimos faraós como figurantes, poderíamos dizer que ela fez um golpe, usando a maquina da persuasão. Em Madagascar, no século XIX temos a rainha Hanavalona que tomou o poder, visto que seu falecido marido, Hadama, não deixou filho homem, ela ilegalmente assume como rainha governante, assim como a rainha Vitória, aliás, com quem ela se identificava.
Constantino, faz guerra aos seus oponentes, e se consolida como imperador romano, os americanos, dão um golpe na coroa britânica e criam a republica dos 13 estados que ficaram unidos. Depois a Revolução francesa dá um golpe em Luis XVI, o século XIX é um período de sucessivos golpes, na Europa e na América Latina., Século XX temos a revolução mexicana, russa, cubana, chinesa, os golpes militares e golpes fascistas, no século XXI, temos a Primavera Árabe com seus golpes, contra os ditadores e regimes oligarquicos.
Assim, comparando, vários deles eram diferentes, mas todos foram tomadas de poder contra um líder.
Golpistas, gostem ou não, a presidente Dilma foi em 2016 retirada por manipulação de massas e leis. E basta estudar o direito para entender que leis não são absolutas, mas são passíveis de interpretação, assim, os homens que interpretaram as leis, interpretaram de acordo com suas motivações políticas, como vários assumiram. Dilma foi deposta, legalmente, mas nem por isso, ser dentro da lei, deixa de ser golpe, o golpe no Brasil do século XIX foi feito por meio de articulistas e manipuladores de votos para assumir constitucionalmente o poder no lugar da autoridade.
Golpe é golpe, seja por armas, ou por votos.